Convite


" A Igreja convida-nos a aprender de Maria (...) a contemplar o projecto de amor do pai pela humanidade, para amá-la como Ele a ama."



Mensagem Bento XVI, Dia Mundial das Missões 2010
















domingo, 3 de janeiro de 2021

 

O Quarto Rei Mago

Uma história de Henry Van Dyke

Vocês sabem a história dos três reis magos que viajaram do Oriente para Belém para adorar a Jesus e lhe ofertar as dádivas de ouro, incenso e mirra.

Vou-lhes contar a história do quarto rei mago que também viu a estrela e resolveu segui-la e do seu grande desejo de adorar o Rei Menino e lhe oferecer as suas prendas.

Ele morava nas montanhas da Pérsia e o seu nome era Artaban. Era um médico, alto, moreno, de olhos bem escuros: a fisionomia de um sonhador, a mente de um sábio. Um homem de coração manso e espírito indominável.

Era um homem de posses. A sua moradia era rodeada de jardins bem tratados com árvores de frutas e flores exóticas. Suas vestes eram de seda fina e o seu manto da mais pura lã. Era seguidor de Zoroastro e numa noite se reuniu em conselho com nove membros da mesma seita. Eram todos sábios!

Artaban lhes falou sobre a nova estrela que vira e o seu desejo de segui-la. Disse-lhes:

“- Como seguidores de Zoroastro aprendemos que os homens vão ver nos céus, em tempo apontado pelo Eterno, a luz de uma nova estrela e nesse dia, nascerá um grande profeta e Ele dará aos homens a vida eterna, incorruptível e imortal, e os mortos viverão outra vez! Ele será o Messias, o Rei de Israel.

E continuou:

“- Os meus três amigos Gaspar, Melchior, Baltazar e eu, vimos a grande luz brilhante de uma nova estrela á vários dias e vamos sair juntos para Jerusalém para ver e adorar o Prometido, o Rei de Israel. Vendi a minha casa e tudo o que possuo e comprei estas jóias: uma safira, um rubi e uma pérola para oferecer como tributo ao Rei. Convido-os para virem comigo nesta peregrinação para juntos adorarmos o rei!”

Mas um véu de dúvida cobriu as faces de seus amigos:

“- Artaban! Isso é um sonho em vão. Nenhum rei vai nascer de Israel! Quem acredita nisso é um sonhador!”

E um a um, todos o deixaram.

“- Adeus amigo!”

Artaban pesquisando os céus viu de novo a estrela.

“- É o sinal!” Disse ele. “- O Rei vai chegar e eu vou encontrá-lo.”

Artaban preparou o seu melhor cavalo, chamado Vasda, e de madrugada saiu ás pressas, pois, para encontrar no dia marcado com Gaspar, Melchior e Baltazar, que já estavam a caminho, ele precisava cavalgar noite e dia. Já estava escurecendo e ainda faltavam mais ou menos três horas de viagem para chegar ao sítio de encontro e ele precisava estar lá antes de meia noite ou os três magos não poderiam demorar mais à sua espera!

“- Mas, o que é isto?”

Na estrada, perto de umas palmeiras, o seu cavalo Vasda, pressentindo alguma coisa desconhecida, parou resfolegando, junto a um objeto escuro perto da última palmeira.

Artaban desmontou. A luz das estrelas revelou a forma de um homem caído na estrada. Um pobre hebreu entre os muitos que moravam por perto. A sua pele estava seca e amarela e o frio da morte já o envolvia. Artaban depois de examiná-lo, deu-o por morto e voltou-se com um coração triste pois nada podia fazer pelo pobre homem.

“- Mas o que foi isto?”

“- Que devo fazer? Se me demorar, os meus amigos procederão sem mim. Preciso seguir a estrela! Não posso perder a oportunidade de ver o Príncipe da Paz só para parar e dar um pouco de água a um pobre hebreu nas garras da morte!”

“- Deus da Verdade e da Pureza, dirige-me no teu caminho santo, o caminho da sabedoria que só tu conheces!”

E Artaban carregou o hebreu para a sombra de uma palmeira e tratou-o por muitos dias até que êle se recuperou.

“- Quem és tu?” perguntou ele ao mago.

“- Sou Artaban e vou a Jerusalém à procura daquele que vai nascer: O Príncipe da Paz e Salvador de todos os homens. Não posso me demorar mais, mas aqui está o restante do que tenho: pão, vinho, e ervas curativas.”

O hebreu erguendo as mãos aos céus lhe disse:

“- Que o Deus de Abraão, Isaac e Jacó o abençoe; nada tenho para lhe pagar, mas ouça-me: Os nossos profetas dizem que o Messias deve nascer, não em Jerusalém mas em Belém de Judá.”

Assim, já era muito mais de meia noite e vários dias mais tarde quando Artaban montou de novo o seu cavalo Vasda e num galope rápido prosseguiu ao encontro de seus amigos.

Aos primeiros raios do sol, checou ao lugar do encontro. Mas… onde estavam os três magos? Artaban desmontou e ansioso, estudou todo o horizonte. Nem sinal da caravana de camelos dos seus amigos! Então entre uma pilha de pedras achou um pergaminho e a mensagem:

“- Não pudemos esperar mais, vamos ao encontro do Rei de Israel. Siga-nos através do deserto.”

Artaban sentou-se e cobriu a cabeça em desespero!

“- Como posso atravessar o deserto sem ter o que comer e com um cavalo cansado? Tenho mesmo que regressar à Babilónia, vender a minha safira e comprar camelos e provisões para a viagem. Só Deus, o misericordioso, sabe se vou encontrar o Rei de Israel ou não, porque me demorei tanto ao mostrar caridade,”

Artaban continuou a via pelo deserto e finalmente chegou em Belém, levando o seu rubi e a sua pérola para oferecer ao Rei. Mas as ruas da pequena vila. pareciam desertas. Pela porta aberta de uma casinha pobre, Artaban ouviu a voz de uma mulher cantando suavemente. Entrou e encontrou uma jovem mãe acalentando o seu bebé.

Três dias passados Ela lhe falou sobre os três magos que estiveram na vila a que disseram terem sido guiados por uma estrela ao lugar onde José de Nazaré, sua esposa Maria, e o seu bebé Jesus estavam hospedados. Eles trouxeram prendas de ouro, incenso e mirra para o menino. Depois, desapareceram tão rapidamente quanto apareceram. E a família de Nazaré também saiu à noite, em segredo, talvez para o Egito.

O bebê nos seus braços olhou para o rosto de Artaban e sorriu estendendo os braçinhos para ele.

“Não poderia essa criança, ser o Príncipe Prometido? Mas não! Aquele que procuro já não está aqui e eu preciso encontrá-lo no Egito!”

A Jovem mãe colocou o bebê no leito e preparou um almoço para o estranho hospede que veio à sua casa. Subitamente, ouviu-se uma grande comoção nas ruas: gritos de dor, o chorar de mulheres, tocar de trombetas e o clamor:

“- Soldados! os soldados de Herodes estão matando as nossas crianças!”

A jovem mãe, branca de terror escondeu-se no canto mais escuro da casa, cobrindo o filho com o seu manto para que ele não acordasse e chorasse.

Mas Artaban colocou-se em frente à porta da casa impedindo a entrada dos soldados. Um capitão aproximou-se para afastá-lo. A face de Artaban estava calma como se estivesse observando as estrelas. Fitou o soldado um instante e lhe disse:

“- Estou sozinho aqui, esperando para dar esta jóia ao prudente capitão que vai me deixar em paz.”

E mostrou o rubi brilhando na palma da sua mão como uma grande gota de sangue.

Os olhos do capitão brilharam com o desejo de possuir tal jóia!

“- Marchem, Avante!” Gritou aos seus soldados. “- Não há criança aqui!”

E Artaban olhando os céus orou:

“- Deus da Verdade, perdoa o meu pecado! Eu disse uma coisa que não era, para salvar uma criança. E duas das minhas dádivas já se foram. Dei aos homens o que havia reservado para Deus. Poderei ainda ser digno de ver a face do Rei?”

E Artaban prosseguiu na sua procura entre as pirâmides do Egito, em Heliopólis, na nova Babilónia às margens do Nilo… Numa humilde casa em Alexandria, Artaban procurou o conselho de um velho rabi que lhe falou das profecias e do sofrimento do Messias prometido e receitado pelos homens.

“- E lembre-se, meu filho: o Rei que procuras não o vais encontrar num palácio ou entre os ricos e poderosos. Isto eu sei: os que O procuram devem fazê-lo entre os pobres e os humildes, os que sofrem e são oprimidos.”

E Artaban passou por lugares onde a fome era grande. Fez a sua morada em cidades onde os doentes morriam na miséria. Visitou os oprimidos nas prisões subterrâneas, os escravos nos mercados de escravos…

Em toda a população de um mundo cheio de angústia ele não achou ninguém para adorar, mas muitos para ajudar! Ele alimentou os que tinham fome, cuidou dos doentes, e confortou os prisioneiros… E os anos passaram… 33 anos.

E os cabelos de Artaban já não eram pretos, eram brancos como a neve nas montanhas. Velho, cansado e pronto para morrer era ainda um peregrino à procura do Rei de Israel e agora em Jerusalém onde havia estado muitas vezes na esperança de achar a família de Belém.

Os filhos de Israel estavam agora na cidade santa para a festa da Páscoa do Senhor e havia uma agitação e excitamento singular. Vendo um grupo de pessoas da sua terra, Artaban lhes perguntou o que se passava e para onde o povo se dirigia.

“- Para o Gólgota!” lhe responderam, “- …pois não ouviste? Dois ladrões vão ser crucificados e com eles, um homem chamado Jesus de Nazaré, que dizem, fez coisas maravilhosas entre o povo. Mas os sacerdotes exigiram a Sua morte, porque disse ser o Filho de Deus. Pilatos O condenou a ser crucificado porque disseram ser Ele o Rei dos Judeus.”

“Os caminhos de Deus são mais estranhos do que o pensamento dos homens,” pensou Artaban. “Agora é o tempo de oferecer a minha pérola para livrar da morte o meu Rei!”

Ao seguir a multidão em direção ao portal de Damasco, um grupo de soldados apareceu arrastando uma jovem rapariga com vestes rasgadas e o rosto cheio de terror.

Ao ver o mago, a jovem reconheceu-o como da sua própria terra e libertando se dos guardas atirou-se aos pés de Artaban:

“- Tenha piedade!…”, ela implorou,…”e pelo Deus da pureza, salva-me! Meu pai era mercador na Pérsia mas faleceu e agora vão me vender como escrava para pagar seus débitos! Salva-me!”

Artaban tremeu. Era o velho conflito da sua alma entre a fé, a esperança e o impulso do amor. Duas vezes as dádivas consagradas foram dadas para a humanidade. E agora? Uma coisa ele sabia:

“- Salvar essa jovem indefesa era um gesto de amor. E não é o amor a luz da alma?”

Ele tirou a pérola de junto ao seu coração. Nunca ela pareceu tão luminosa! Colocou-a na mão da moça:

“- Este é o teu pagamento, o último dos tesouros que guardei para o Rei!”

Enquanto ele falava uma escuridão profunda envolveu a terra que tremeu consultivamente! Casas caíram, os soldados fugiram mas Artaban e a moça protegeram-se de baixo do telhado sobre as muralhas do Pretório.

“- O que tenho a temer,” pensou ele,” …e para quê viver? Não há mais esperança de encontrar o Rei, a procura terminou, eu falhei.”

Mas mesmo esse pensamento lhe trouxe paz pois sabia que viveu de dia a dia da melhor maneira que soube. Se tivesse que viver de novo a sua vida não poderia ser de outra maneira.

Mais um tremor de terra e uma telha desprendeu-se do telhado e feriu o velho mago na cabeça. Repousou no chão e deitou a cabeça nos ombros da jovem com o sangue a escorrer do ferimento.

Ao debruçar-se sobre ele, ela ouviu uma voz suave, como música vindo da distancia. Os lábios de Artaban moveram-se como em resposta e ela escutou o que o velho mago disse na sua própria língua:

“- Não meu Senhor! Quando te vi com fome e te dei de comer? ou com sede e te dei de beber? ou quando te vi enfermo ou na prisão e fui te ver?

Por 33 anos eu te procurei, mas nunca vi a tua face, nem te servi, meu Rei!”

E uma voz suave veio, mas desta vez dos céus. A jovem também compreendeu as palavras.

“- Em verdade, em verdade vos digo que quando o fizeste a um destes meus irmãos a mim o fizeste!”

Uma alegria radiante iluminou a face calma de Artaban.

Um suspiro longo e aliviado saiu de seus lábios.

A viagem para ele havia terminado.

O quarto mago, Artaban, compreendeu que havia encontrado o seu Rei durante toda a sua vida!


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